domingo, 10 de junho de 2012

A Teoria Ator-Rede (TAR)

 A ATR enfatiza a idéia de que atores, humanos e não humanos, estão constantemente ligados a uma rede social de elementos (materiais e imateriais), destacando que rede não está no sentido técnico (eletricidade, trens, internet..) nem no sentido utilizado na sociologia das organizações para introduzir as diferenças entre organizações, mercados, estados. A concepção de rede aqui implica conceitos-chave tais como sociologia das associações em oposição às sociologias do social, actante em oposição a ator e, sobretudo, em lugar de mero intermediário, o conceito especializado de mediador que só se faz entender à luz do significado específico que a palavra “tradução” recebe na TAR.
 Para isso, comecemos com a diferenciação dos dois conjuntos de práticas:
Práticas de purificação 
 Criam zonas distintas (por isso, podemos associa-las ao modelo discreto):
humanos (sociedade), não humanos (natureza) e extra-humanos (extra-social, extra-cultural).
Assim, separam em tantos segmentos quanto forem as disciplinas puras.
Práticas de tradução
 Criam repositórios de fatos aparentemente objetivos e distintos e fazem proliferar híbridos de natureza e cultura, misturas (e por isso, podemos associa-las ao modelo contínuo) complexas que apenas uma topologia de redes pode capturar, em contraste com a topologia de superficies/ áreas adotadas pelas práticas de purificação. 
 "A ligação entre esses dois tipos de práticas estaria no cerne do que o autor chama de "a constituição moderna". Ser moderno é, em essência, acreditar nessa separação de propriedades, poderes e maneiras dos humanos e dos não humanos de se agruparem e de se governarem e, ao mesmo tempo, presenciar a proliferação de híbridos." (BUZATO, 2009. p.71)
 A proposta de Latour funda-se no pressuposto que humanos e não-humanos são actantes definiveis relacionalmente, a partir das maneiras como agem/ resistem nessas redes de práticas. 
"Uma das afirmações mais contundentes da teoria ator-rede, especialmente reiterada por Bruno Latour, é a de que o social não existe.[...]. O “social” não é o que explica, diz a teoria ator-rede, mas o que merece ser explicado."

Regra metodológica da TAR:
"estudamos ciência em ação, e não a ciência ou a tecnologia pronta; para isso, ou chegamos antes que fatos e máquinas se tenham transformados em caixas-pretas, ou acompanhamos as controvérsias que as lembrem" (latour, 2000, P.412)

Postulado central da TAR:
 "a ação é emprestada, distribuída, sugerida, influenciada, dominada, traída, traduzida" (LATOUR, 2005, p. 46)
 
Pressupostos contestados pela TAR:
a) O contexto funcionaria como um contêiner pré-existente à própria prática letrada
b) Seria possível isolar as ações que tentavamos interpretar em dois compartimentos isolados, o global e o local
Para a TAR...
a) inválido, pois "movimento e deslocamento vêm primeiro, lugares e formas, depois"
b) não se sustenta porque "global e local são sítios que não existem", "utopias encantadas", impossível de localizar no mapa: "nenhum  lugar é suficientemente dominante para ser global, nem suficientemente autocontido para ser local" 


Intermediário e mediadores:
Intermediário --> actante cujo outputs estão perfeitamente previstos pelos inputs que recebe
- um intermediário simplesmente transportam uma causa anterior, sem nada acrescentar a ela
- veicula informação sem deformação
Mediadores --> são actantes que quando acionados como veículos, fazem outras coisas que não as esperadas
- não transportam sem deformação
- de seus efeitos não se podem deduzir causas
 Cada mediador pode ser alistado por e/ou alistar outros atores em outras redes. Foram, assim, se configurando certos efeitos de rede que não poderiam ser deduzidos diretamente de uma causa anterior e exterior a essa concatenação.

Pressupostos da TAR:
1) Nenhuma interação é isotópica: aquilo que está agindo num mesmo momento, em qualquer lugar, vem de muitos outros lugares, de muitos materiais e atores distantes. 
2) Interações não são homogênias, elas são heterogêneas.   

- Rede heterogêneas -
 "As redes são compostas não apenas por pessoas, mas também por máquinas, animais, textos, dinheiro, arquiteturas – enfim quaisquer materiais. Portanto o argumento é que o que compõe o social não é simplesmente humano. O social é composto por todos esses materiais também. Na verdade, o argumento é que nós não teríamos uma sociedade, de modo algum, se não fosse pela heterogeneidade das redes do social.
[...]O argumento é que essas várias redes participam do social. Elas o moldam. [...]
Se os seres humanos formam uma rede social, isto não é porque eles interagem com outros seres humanos. É porque eles interagem com seres humanos e muitos outros materiais também. E, exatamente como seres humanos têm suas preferências – eles preferem interagir de certas formas e não de outras – esses outros materiais que compõem as redes heterogêneas do social também têm suas preferências. Máquinas, arquiteturas, roupas, textos – todos contribuem para o ordenamento do social. E – esse é o meu ponto – se esses materiais desaparecessem também desapareceria o que às vezes chamamos de ordem social. A teoria ator-rede diz, então, que ordem é um efeito gerado por meios heterogêneos."
(John Law)

Templates ou localizadores
 Os eventos locais são pré-formatados por templates ou localizadores que contextualizam a ação. Mas eles projetam apenas um sujeito/individuo genérico. Um manual de montagem de uma máquina, por exemplo, são projetados para "alguém como eu", mas não projetadas "para mim".  Há, portanto, uma lacuna a ser preenchida "entre os atores genéricos, pré-formatados por esses movimentos e o curso da ação realizada por participantes totalmente individualizados." (LATOUR, 2005, p.205)
Para preencher essa lacuna, é necessário  que os atores tenham uma certa competência a qual ou se nasce com ela (humano) ou se é moldado nela (por força da estrutura social). A TAR coloca essa competência como um conjunto de subjetificadores (marca que identifica o sujeito), individualizadores ou persolanizadores que acumulamos enquanto ator-rede. Ou seja, não há subjetividade no interior do sujeito: há plug-ins aos quais podemos nos utilizar para preencher essa lacuna. O fato é que, do ponto de vista da TAR, nada há em nossa interioridade que não nos tenha sido dado.
 
REFERÊNCIAS
http://dispositivodevisibilidade.blogspot.com.br/2011/11/teoria-ator-rede-e-cibercultura.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_ator-rede
http://www.necso.ufrj.br/Trads/Notas%20sobre%20a%20teoria%20Ator-Rede.htm
BUZATO, M. Letramento, novas tecnologias e a teoria ator-rede: um convite à pesquisa.  

Fundamentação metodológica da ACD

A ACD propõe que cada evento discursivo seja analisado em três dimensões:

1) Texto: 
- busca a descrição
- descrição: inclui o léxico, as opções gramaticais, a coesão e a estrutura do texto
- nivel mais próximo aos significados literais
- enfatiza as implicações ideológicas
- relexicalização (p.e. o uso de danos colaterais ao invés de matar pessoas civis)
 Para a análise das estruturas linguísticas, Faircloug adota noções da LSF de Halliday:
Multifuncionalidade: a lingugem é multifuncional porque realiza três tipos de significações simultaneamnete (como a formalção das cores em um arco-iris) , as que Halliday cham de metafunções da linguagem.
 a) Significados ideacionais: representar a realidade de determinada maneira, refletindo/ criando determinados conhecimentos e crenças
- transitividade do verbo e seus argumentos
- quem faz/ é/ pensa diz o que em que circunstância
b) significados interpessoais: estabelecer relações sociais

- tem haver com o intersubjetivo
- modo/ jeito/ maneira que o texto se dirige (categórico, ordem, pedido...)


c) significados textuais: organizar o texto de determinada maneira, dependendo em parte do canal oral ou escrito
- distribuição de informações dentro do texto
existe uma ordem temporal?
a assunto principal vem no começo?
está distribuuido em parágrafos?

  Cada um desses três tipos de siginificados é realizado por um aspecto especifico da léxico-gramática [...]. O potencial para a produção de siginificados que a linguagem oferece é chamado de potencial semântico. Dentro do potêncial semântico:
significadosideacionais: realizados pela transitividade
significados interpessoais: realizados pelo modo verbal
significados textuais: realizados pelo sistema tema e rema

2) Prática discursiva
- interpretação: é a partir da forma que o texto circula que é possível interpretar o que se diz
- onde circula, de que forma, em que época
- coerência, força ilocucionária, intertextualidade e interdiscursividade
- participando da circulação que adquirimos a competência genérica, conhecimento de mundo (ao natermos o olho em uma reportagem, já sabemos qual o gênero pois pelo nosso conhecimento, fazemos comparações e percebemos elementos em comum entre os textos de mesmo gênero)
- a simulação está muito presente em toda produção de texto. A linguagem representa o mundo, simula

3) Prática social
- Ideologia e hegemonia
- crenças sociais
- explicação: só é possível explicar e se fazer entender porque é necessário se passar pela ideologia
- naturalização: se um texto opera com o senso comum, ele trata algo como natural, silenciando todas as outras realidades possiveis. "No processo de produção de consenso, de naturalização, a ideologia tem um papel contundente, podendo levar às pessoas a agir de determinadas formas, tanto a seu favor como contra si própria." (p.102)
- a realidade é criada discursivamente
- os textos são investidos ideologicamentes e refletem lutas de poder
- os siginificados variam depedendo das estruturações sociais e dos discursos que os orientam

 É importante ressaltar que esses três niveis se relacionam e não devem ser vistos como estanques, assim podemos analisar um texto por diferentes portas de entradas: podemos iniciar a análise tanto com a questão social como de práticas discursivas ou social.

Fundamentação teórica da ACD

Para fins didáticos, é possível separar duas vertentes da ACD:  a fundamentação teórica e a fundamentação metodológica, resaltando que essa divisão apenas facilita a visualização, mas na verdade, a teoria e o método não podem ser separadas.
 Na primeira vertente, podemos pontuar:
1) Discurso como prática social: o discurso é uma prática social que se realiza por intermédio de gêneros textuais específicos. Essa concepção tem 3 implicações:
a- o principio de que os individuos realizam ações por meio da linguagem (teoria dos atos de fala do Austin).
b- o princípio de uma relação bidirecional entre discurso e estrutura social, ou seja, o discurso influencia e é diretamente influenciado pelas estruturas sociais. A ACD procura explicitar como diferentes discursos e estruturas sociais determinam "o que pode e deve ser dito" (Pêucheux, 1982, p. 111), como os textos devem ser interpretados e o que pode e deve ser feito.
c- preocupação com os recursos soiocognitivos dos individuos que produzem, distribuem e interpreta, textos. Para a ACD, os discursos moldam a maneira como os individuos usam seus recursos cognitivos, e os textos significam aquilo que os discursos 'permitem' que signifiquem.

2) O poder constitutivo do discurso:
 O discurso tem efeitos constitutivos (Foucalt) porque por meio dele os individuos constroem ou criam realidades sociais. Faircloug privilegia três aspectos do poder criativo do discurso: a constituição de
a- formas de conhecimento e crenças
b- relações sociais
c- identidades

3) Textos como traços e pistas de rotinas sociais - Opacidade e naturalização
 Faircloug enfatiza a necessidade de analisar os traços e pistas que ocorrem em diferentes gêneros textuais, buscando evidenciar como eles refletem discursos e rotinas sociais.
 Ele resalta que muitas das relações entre linguagem e estrutura são opacas e busca o esclarecimento sobre isso (justificavel pelo termo crítica da ACD). Essa opacidade se dá, além do caráter constitutivo do discurso, pela naturalização criada, isto é, as realidades criadas discursivamente como algo natural, imutável, parte da sua própria natureza.

4) Discurso e relações de poder
 A ACD procura entender como os textos são perpassados por relações de poder (capacidade de fazer uso de algum tipo de recurso para agir) e hegemonia (liderança tanto quanto dominação nos domínios econômicos, politico, cultural e ideológico de uma sociedade).
 Uma contribuição importante é a investigação de como o exercício de poder hegemônico no mundo contemporâneo se mescla com as práticas discursivas.
Faircloug fala em poder no discurso e poder por trás do discurso.
poder no discurso: mais visivel, podendo ser exercido através das palavras ou textos específicos
poder por trás do discurso: determinam qual gênero é mais apropriado para determinadas situações.
 Isso quer dizer que ao mesmo tempo em que uma prática social pode repetir ou reforçar práticas anteriores, pode também desafia-las, questiona-las e mudá-las.

5) Discurso, poder e ideologia
"Todas as ideologias sçao signifcações, embora nem todas as siginificações sejam ideologias" (p.92)
É importante colocar que a ideologia é constituída por significações, formas de ver o mundo, que se manifestam em textos, contribuindo para manter ou mudar formas de poder, uma vez que, a força não é imposta pela coerção, mas sim pelo dicurso, as pessoas são levadas a cooperar consensualmente.

6) Correntes de textos
Adota a perspectiva de Bakhtin na qual diz sobre "corrente ou cadeia de textos: cada texto é precedido por/ responde a textos anteriores e é seguido por outros textos. Os textos são parte de um diálogo em andamento." (p.93) Isso pode ser visto na intertextualidade que frequentemente podemos notar entre os textos.

7) ACD e emancipação
A ACD procura conscientizar os individuos quanto as interligações entre o discurso e as estruturas sociais, representando, portanto, uma forma de luta por mudanças sociais.
" Faircloug acredita: uma vez que alguém se torne consiente do valor ideológico de determinado discurso, pode resistir a ele, e o aspecto ideológico pode consequentemente perder ou diminuir o seu efeito. A compreensão do papel da linguagem como prática social pode cooperar para a emancipação de grupos menos privilegiados." (p.94)

REFERÊNCIAS
MEURER, J.L. BONINI, A., MOTTA-ROTH, D. (ORG.). Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola editorial, 2005.

Introdução à Análise critica do discurso (ACD)

A ACD é uma teoria e um método de análise que interessa-se em estudar não apenas o texto em si, mas também as questões socias, que englobam as maneiras de representar a realidade, as manifestações de identdade e as relações de poder no mundo contemporêneo.
 Essa teoria, desenvolvida por Fairclough, iniciou-se no fim de 1980 em continuação à Linguistica crítica (Fowler) se contrapondo à sociolinguística, à pragmática, à analise da conversação, aos estudos de Pêcheux, entre outros.
Principal critica a elas:
 nenhuma delas investiga a ligação do uso de formas discursivas com a "produção, a manutenção e mudanças de relações de poder" (Faircloug, 1989, p.1)
Incorporação de aspectos positivos:
da pragmática: incorpora a noção de linguagem como ação
de Pêcheux: incorpora a idéia de que a linguagem é uma forma material da ideologia
da linguística crítica: incorpora a ideia de casar a Linguistica funcional sistêmica (LSF) com uma teoria social do funcionamento da linguagem.
Influências:
- Antonio Gramsci (filosofia)
- Anthony Giddens (sociologia)
- Michel Foucault (visão de discurso)
- Mikhail Bakhtin (teorização sobre intertextualidade)
 É importante ressaltar a conexão entre a LSF e a ACD, uma vez que a LSF é utilizada como instrumento de análise na ACD, o que acabou contribuindo para a crescente expansão da própria LSF. É conceso entre elas que o contexto tem implicações cruciais para a análise da linguagem em uso.
 Antes de começar...
É preciso diferenciar texto e discurso, tendo em vista que
- vivemos em ambientes institucionalmente organizados
- as instituições são caracterizadas por práticas e valores especificos
- tais valores são expressos atráves da linguagem

Assim, podemos entender as grandes diferenças dos textos criados dentro da igreja, escola, indústria, ciência, etc, uma vez que cada instituição possui o seu discurso e isso se manifesta diretamente nos textos criados.

REFERÊNCIAS
MEURER, J.L. BONINI, A., MOTTA-ROTH, D. (ORG.). Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola editorial, 2005.