sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Conceitos chaves de Saussure


O signo linguístico

O signo é um resultado de uma relação dicotômica: significado (conceito, abstrato) e significante (som, concreto). Ele é de natureza psiquica e por isso é constituído de conceito e imagem acústica. Não precisa de nada material. É forma, não substância.
Se, com relação à idéia que representa, o significante aparece como escolhido livremente, com relação à comunidade linguística que o emprega é imposto. Nunca se consulta a massa social se o significante escolhido pela língua poderia ser outro. Um indivíduo não somente seria incapaz, se quisesse, de modificar em qualquer ponto a escolha feita, como também a própria massa não pode exercer sua soberania sobre uma única palavra: está atada a língua tal qual é. Por isso se diz que o signo é imutável. Além do que, sendo o signo convencional e sem relação natural entre significado e significante, não há nada que comprove que uma cadeia sonora, por exmeplo, seja melhor do que a existente, logo, não se justifica a mudança. Soma-se isso a grande quantidade de signos, ao caráter demasiado complexo do sistema e a resistência da inércia coletiva a toda renovação linguística e é fácil entender porque a comunidade não vê a necessidade de alterar um signo.
Ao mesmo tempo, podemos dizer que o signo também é mutável. Da mesma forma que o tempo assegura a continuidade da língua, este altera mais ou menos rapidamente os signos. Pode-se falar ao mesmo tempo de mutabilidade e imutabilidade visto a língua poder se transformar ao longo dos tempos, mas sem intenção direta dos falantes. O signo altera-se pois continua a existir e a evoluir (principio da continuidade), sendo o resultado sempre um desvio na relação entre significado e significante. Ao organizar a parole, o falante desloca os signos. É imposrtante resaltar que o falante não age diretamente no sistema, ele age sobre a parole que por consequência influência (muda) o sistema.

Sintagmas e paradigmas

Um sintagma é um segmento linguístico que expressa uma relação de dependência.
Ao colocar a linearidade como uma das características essenciais do signo (o significante, sendo de natureza auditiva, desenvolve-se no tempo, e tem as características que toma do tempo. O som se propaga linearmente, logo o significante também será.), Saussure havia observado que os signos falados formam uma cadeia onde cada elemento do plano de expressão ocupa uma posição determinada (distribuição): não se pode pronunciar dois fonemas na mesma unidade de tempo. As palavras presentes no discurso contraem certas dependências fundadas no caráter linear da língua: colocado num sintagma, um termo só adquire valor porque se opõe ao que o precede ou ao que o segue, ou a ambos. A dependência que existe entre 2 elementos sequenciais de uma mesma cadeia chama-se relação sintagmática.
O discurso sintagmático dispõe-se sobre um eixo cujo suporte segmental é a extensão linear dos significantes e cuja propriedade básica é a de construir-se através da combinação de unidades contrastantes. Esse contraste se dá entre elementos do mesmo nível.
Por fim, cumpre atribuir à língua, e não a fala, todos os tipos de sintagmas construídos sobre formas regulares.
Os paradigmas, por sua vez, são conjuntos organizados da língua onde o falabte seleciona elementos para seu enunciado. Alguns paradigmas são fixos, porém muitos paradigmas são formados a partir do sintagma. Em outras palavras, um paradigma é uma classe de elementos que podem ser colocados no mesmo ponto de uma mesma cadeia (sintagma), ou seja, são substituíveis ou comutáveis. As palavras que oferecem algo em comum se associam na memória e assim se formam grupos dentro dos quais imperam relações diversas( como sinônima, antonímia, hiperonímia, etc).
No momento de organizar um sintagma, o falante também organiza os paradigmas, pois em função do sintagma que se está construindo o elemento estará em um ou outro paradigma. Vejamos o exemplo da palavra baixo. Em uma frase como: Não seja tão baixo!, baixo se situa em um mesmo paradigma que obsceno, grosseiro, indecente, respeitável, educado, entre outros. Já em Zé é mais baixo que Leo, baixo estaria em um mesmo paradigma que alto, pequeno, grande, etc. Assim, os signos se relacionam com suas características comuns e com suas diferenças específicas.

O valor linguístico de saussure

Um elemento e qualquer elemento não tem um valor próprio. De certa forma, ele não existe até o momento em que relaciona-se com outro elemento, ou seja, existem porque interagem, um sustenta o outro.Por isso pode-se dizer que um signo é aquilo que os outros não são, justamente porque estão em uma relação diferencial e negativa entre si dentro do sistema da língua. Assim, se um elemento se modifica, há uma recombinação (lenta e gradual) do sistema. Por exemplo, invertendo-se os elementos em um enunciado o signo tem seu valor alterado.
Isso ocorre porque a língua não é um sistema de conteúdos, mas um sistema de formas e de regras (valores). Em outras palavras, a descrição de um sistema linguístico não é a descrição física de seus elementos, mas sim a descrição de sua funcionalidade e pertinência. Saussure utiliza a metáfora do jogo de xadrez para elucidar: uma determinada peça não tem seu valor pelo material de que é feito ou pela aparência que tem. Tanto é que se perdermos alguma peça podemos substitui-la por qualquer outro objeto, desde que os participantes convencionem que este assumirá o valor da peça perdida. Assim, o valor da peça está na relação de oposição que tem com as outras peças e da sua oposição em relação ao todo.
Os valores são regidos por dois princípios paradoxal:
1- por uma coisa dessemelhante, suscetível de ser trocada por outra cujo valor resta determinar
2- por coisas semelhantes que se podem comparar com aquele cujo valor está em causa.
Dessa forma, uma ideia pode ser comparada tanto a algo de mesma natureza, como a coisas de naturezas distintas.
A única oposição positiva é a que se dá no encontro de um significante e de um significado no signo linguístico:
Mas dizer que na língua tudo é negativo só é verdade em relação ao significante e ao significado tomados separadamente: desde que consideremos o signo em sua totalidade, achamo-nos perante uma coisa positiva em sua ordem. (CLG, pág. 139)
Essa teoria de Saussure de que "tudo está imbricado com tudo"  contraria a longa tradição que colocava em correspondência palavras e idéias, tratando as palavras como unidades autônomas de análise. Saussure tinha descoberto na língua uma construção legitimamente estrutural, i.e, uma construção onde o conjunto de relações entre os objetos é mais fundamental que os próprios objetos.

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Langue e Parole

Langue (Língua)
- Sistema abstrato
- "Regra do jogo"
- Dimensão social
- Forma/Estrutura: é independente da substância física (ou meio) em que se realiza.

Parole (Fala)
- Possíveis usos do sistema
- Episódios comunicativos historicamente realizados
- Condições de possibilidades das mensagens
- Dimensão individual

A intrínseca relação langue/parole está no fato de que os indivíduos utilizam a linguagem de forma individual, mas sua ação verbal só tem os efeitos que tem por causa que ele utiliza de um sistema que é comum aos membros da comunidade linguística a que pertence. A partir disso, os estruturalistas, seguindo Saussure, entenderam que não se poderia ter um estudo realmente cientifico de um uso individual (parole). Assim toda a atenção foi dada às "regras do jogo", isto é, a langue, deixando aos estudos da parole um caráter secundário.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Gramaticalidade versus Aceitabilidade

Por definição, toda sentença é bem formada no sistema linguístico em que se constitui como sentença, tanto sintática como morfologicamente, i.e., são gramaticais (LYONS, 1982, p.45). Assim, gramaticalidade está ligada ao fato de que todo falante nativo é capaz de produzir sentenças bem estruturadas, estando ligado a gramática natural da língua e não à gramática normativa. Assim, mesmo uma frase como
Me empresta a caneta?
considerada errada para a gramática normativa ("Não se inicia frase com pronome"), é dotada de gramaticalidade. Já a sequência
empresta caneta me a?
não é uma sentença em português, justamente por não respeitar as regras gramaticais do sistema linguístico, o qual os falantes nativos aplicam inconscientemente. No entanto, podemos encontrar sentenças que não nos geram nenhum significado literal coerente como "Idéias verdes incolores dormem furiosamente", mas que são perfeitamente gramaticais. Aí que entra a aceitabilidade.
Uma sentença aceitável é aquela que possui uma forma significativa, com possibilidade de ser usada em um contexto que transmita informação, isto é, facilmente interpretável por um falante nativo da língua. Assim, uma frase como
*Leo jogou vídeo game por cima do muro
pode ser considerada inaceitável (marcado pelo sinal *), pois o predicado [jogar video game] não aceita um complemento como [por cima do muro].
É por isso que, Segundo Laporte (2015), uma das razões para considerar aceitabilidade mais interessante que gramaticalidade é o fato de que muitas sentenças gramaticais são recusadas por falantes nativos, sendo a gramaticalidade, portanto, menos confiável que a aceitabilidade. 
 

Críticas de Lyons à partida de xadrez de Saussure

Em Lingua(gem) e Linguística¹, John Lyons apresenta algumas críticas à comparação que Saussure faz da língua com uma partida de xadrez. Saussure utiliza tal metáfora para exemplificar uma descrição sincrônica da língua. Segundo ele, o estado do jogo pode ser descrito a qualquer momento quanto à posição em que as peças ocupam, sem que seja preciso saber o que ocorreu antes e o que ocorrerá depois. Assim, mesmo que o tabuleiro esteja em constante modificação, os estados sucessivos de uma partida podem ser descritos sem referências externas. O mesmo ocorre com a língua.
A primeira crítica de Lyons a essa analogia é o fato de um jogo de xadrez ter começo e fim bem delimitado, enquanto que as línguas não. Uma palavra deriva de outra anterior, que deriva de outra antes dela e assim sucessivamente sem que se possa alcançar claramente sua origem - e é por isso que os etimólogos hoje não se ocupam de investigar as origens de um vocábulo, mas apenas afirmar que a forma e o significado do ancestral mais antigo é tal. Também não se pode saber com clareza o momento em que uma língua "morre", a não ser quando isso ocorre abruptamente como com a morte de seu último falante.
Outra crítica diz respeito ao fato do xadrez possuir regras explicitamente formuladas e, assim, os jogadores, dentro desses limites, podem determinar o curso da partida. O mesmo não ocorre com a língua, pois não há uma direção preestabelecida no desenvolvimento diacrônico das línguas.
Apesar de pertinentes, devemos fazer uma resalva a essas críticas. Conforme Chaud (2013) muito bem coloca, Saussure se utiliza dessa metáfora com finalidades didáticas e, como tal recurso, não deve ser tomado ao pé da letra. A metafora deve ser tomada como um recurso para estabelecer identidade, se aplicando somente a algumas características (ORTONY, 1975 apud CHAUD, 2013). Seria plausível se a crítica fosse na essência da comparação, ou seja, na visualização do diacrônico e do sincrônico, o que de fato não ocorre.

¹ Lyons, J. Lingua(gem) e Lingüística: Uma Introdução. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1982.